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terça-feira, 4 de junho de 2013

[CONCURSO CULTURAL] 1º Finalista - "Mural"

Desde o dia 14/05, foram 48 contos enviados para a nossa caixa de entrada, 38 inscrições válidas - infelizmente, muita gente foi desclassificada por ultrapassar o limite de 3500 caracteres - e muita deliberação dos nossos jurados. Cinco colaboradores da NRA leram conto a conto e chegaram, por fim, a dois finalistas.
Confira hoje o primeiro concorrente que irá disputar o seu voto a partir de amanhã: Mural, conto enviado por W. Donadon!


Seria complicado demais explicar tudo.
Não porque tenha muitos detalhes, com reviravoltas e tudo mais; não, não. Florear a história a tornaria mentira; bancar o Romeu e descrever cada sensação, gosto e cheiro, indicar a música que tocava e como foi olhar em seus olhos pela primeira vez não passaria de uma mera enganação. Não sei fazer isso.
Aconteceu num dia chuvoso. Eu entrei na cafeteria inteiro encharcado, porque – como sempre – tinha esquecido meu guarda-chuva em casa, e fiz meu pedido com uma dose de mau humor vinda dos céus e da fila quase quilométrica que tive que enfrentar para chegar à funcionária quase sempre entediada. Ela, a tal garota, estava apenas sendo alvo da minha inveja, sentada numa das poltronas mais confortáveis do lugar tomando algo quente que parecia delicioso.
Não dei muita atenção para a garota-do-óculos-e-rabo-de-cavalo naquele instante. Não estava em clima simpático para arrumar um jeito de puxar papo e sou até um pouco insuportável quando estou nele, então preferi poupá-la daquela experiência catastrófica. Vaguei pelo lugar com esperança em riste, pronto pra lutar por um assento no lugar superlotado. Qual achei? Um dos altos e sem encosto no velho estilo “quero te deixar corcunda”. Pensei: Olá, Murphy! só para alimentar minha animação de baixo nível.
Fazer o quê? Sentei.
Tirei meu lápis e caderno de desenhos da mochila ensopada – que por sorte é à prova d’água – e apoiei-o no curto espaço de mesa que me era dedicado. Caçando inspiração, caçan... Ahá! Lá estava ela, de novo atraindo meu olhar. Dessa vez dediquei um tempo para observar seus traços, mas confesso que não houve sentimento naquilo, qualquer que fosse; uma observação meramente profissional, para treinar minhas habilidades de desenhista amador e me relaxar do dia estressante que havia tido. Confesso também que não identifiquei traços da beleza delicada nela, do tipo que costumo ver em garotas por ai; achei isso o máximo! Tinha as maçãs altas e maxilar firme. Olhos grandes e espertos por trás dos óculos e cabelos pretos presos num rabo-de-cavalo que combinava com seu estilo. Lia algum livro; não vi o título, mas era grosso e de capa dura. Fones no ouvido. Pés batendo ritmados no chão.
Desenhei-a por cerca de meia hora até esquecer que ainda estava molhado. Desenhei-a por mais meia hora até esquecer que já estava com dores de tanto ficar debruçado na cadeira. Quando terminei, parei para contemplar minha obra: um retrato um tanto bom.
Questões existencialistas passaram pela minha cabeça naquele instante, mas só as comento aqui porque foram elas que me levaram às outras: Qual seu nome?Por que está sozinha? Que tipo de músicas gosta? O que está lendo?
Surfei por pensamentos desconexos vindos como ondas que me tragavam para dentro dela; então saí do meu transe quando a garota se levantou da poltrona, caminhou até o lixo e jogou seu copo descartável. Parou em frente a um mural e leu algumas notas penduradas por clientes. Cruzou mesas na direção da porta, pronta para sair, e olhou bem no fundo dos meus olhos quando passou por mim. Não consegui desviar o olhar. Fiquei estagnado. E ela se foi.
Se foi.
Nunca mais a veria. Por mais que agora desejasse conhecê-la, nunca mais a veria. Quais as chances, naquela cidade imensa? Suspirei desanimado enquanto varria a cafeteria com os olhos, que vidraram por fim o mural. Então tive uma ideia. Talvez funcionasse, talvez não. Apenas virei a folha do meu desenho e comecei a escrever uma carta:
“Seria complicado demais explicar tudo.”

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7 comentários:

  1. E o outro finalista? Sai ainda hoje?

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  2. Gostei do conto, é leve e bem escrito.

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  3. Muito bom O conto, parabéns! Se o outro for tão bom quanto esse, vai ser uma disputa acirrada!
    Cafe-elivro.blogspot.com.br

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  4. Parabéns Willian! Excelente conto,e dado o nível do segundo finalista com certeza vc vai levar essa!

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