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segunda-feira, 21 de setembro de 2015

[FEITO A MÃO] Vestígios

Déjà vu



VESTÍGIOS

Hoje foi um longo dia. Pela manhã, teve uma mostra de arte no Centro e um amigo me tragou para lá. Depois, formos comer sanduíches no outro lado da rua e pegamos ônibus para irmos para o trabalho. Horas depois, fui ao ponto de ônibus, peguei uma linha próxima de casa, desci e dei uns 20 passos. Minha mente se achava pesada, não sei por qual razão, e minhas pernas não tinham mais energia para dar outro passo. Por mais que eu me forçasse, meus pés não saiam do lugar. A lua ainda não se encontrava no alto do céu e nem as cigarras das árvores ao meu redor chiavam. Agora eu as ouço cantar, agora que minha bochecha se instalou na sensação gelada desse banco.

Não quero fechar os olhos, mas escuro uma espécie de melodia nos fundos da minha consciência. Lá, no limite com o inconsciente. Um rapaz toca violino, uma música clássica que sempre ouvia alguém tocar e nunca sei qual é a canção. Também há o barulho dos carros, do farfalhar do ipê imposto a alguns metros da minha perna e de garotos chamando pessoas para irem a um curso de inglês. Estou só com a blusa de algodão da empresa, uma calça jeans, meu cabelo em um rabo de cavalo e meus tênis. Mas eu sinto frio. E é esquisito, pois eu imaginava que minha cidade fosse quente, mas de repente tenho a sensação de virar gelo.

Eu me pergunto o que aconteceu para eu me encontrar nessa situação. Eu dormi relativamente bem, umas cinco horas, o suficiente para que meu corpo não se movesse como um zumbi. Apesar disso, meus olhos arderam todo o dia de hoje e, mesmo com a breve soneca no horário de lanche, a impressão não passou. Tive que me esforçar para dialogar em uma sequência e em um pronunciamento que fossem críveis, já que meu raciocínio não se achava em suas melhores condições. Graças a Deus meu amigo se achava próximo para me ajudar. Conseguiu ler a situação e falou por mim. Geralmente esse procedimento traz confusão para meus colegas, como ele parece sólido apenas quando fala. Quando está quieto, outros dizem “parece fazer parte das paredes”.

Estou perdendo minha batalha contra Morfeu. A entidade não demorará a me abraçar, como acredito que sempre faz com a maior paciência do mundo. A vontade de dormir me soca por dentro, tenta destruir minha resistência e me fazer entregar a um diluído silêncio. Ouço o violino tocar mais longe e uma pequena multidão. Tem gritinhos de crianças, sons agudos que me mantêm firme com um tempo. O vento corre pelas ruas e traz consigo folhas soltas e uma delas pousa em cima de minha cabeça. Não sei como, mas sinto que isso já aconteceu. Não sei explicar, somente sinto. É terno, porém é frio. Acho que ouvi a sirene da polícia, provavelmente os policiais vieram espiar. Eu não ouço confusão, nem “Pega ladrão” ou algo que possa me fazer erguer.

Eu não tenho energia para sair do lugar, no entanto vem uma vontade danada de espirrar. Deve ser o frio. Espirro. Sinto a ponta do nariz um pouco molhado, mas não tenho ânimo para esconder em um hábito decente. Meus cinco sentidos dançam. Espirro de novo e a imagem vibra, vibra mais. É como se o que há nos meus olhos fosse refletido em um lago. Há uma sombra, acho que o vento assopra meus cabelos e creio que ouvi alguém dizer o meu nome. Não vi o meu amigo, então deve ser ele reaparecendo. Falando nisso, não é a primeira vez que ouço uma voz falar meu nome antes de eu dormir. Não sei se é meu amigo. Não lembro como é a voz dele.

Minha testa fica tensa. Deve ser o sono. Ou o frio, não sei. A vontade de espirrar retorna, mais brutal que antes.

Espirro.

fim

Aí, leitor, interessado em publicar seu conto, crônica, poema ou desenho na coluna Feito a Mão? Mande seu texto ou seu desenho pra o e-mail contatonra@gmail.com :)

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