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sábado, 19 de dezembro de 2015

[FEITO A MÃO] Correndo dos lobos - Parte II

Créditos: http://www.inape.org.br/colunas/fisica-conceito-historia/gota-chuva-movimento-nao-tao-livre
A artista aspirante Daniela Araújo é convidada por um velho amigo a comparecer a uma pizzaria.


CORRENDO DOS LOBOS - PARTE II


Boa tarde disse a jovem à cobradora antes de mostrar sua carteirinha.
Boa noite, menina respondeu a mulher que parecia ter seus quarenta a cinquenta anos Já está tarde para se dizer boa tarde.
Daniela deu uma risadinha acanhada assim que a catraca foi liberada para ela passar, mas logo parou ao enxergar o ônibus com as pessoas em quase todos os espaços possíveis do interior do veículo. Encostou-se na parte de trás do ônibus, detrás de um homem de meia idade e de uma outra garota de idade aproximada a dela.
Um rapaz de boas vestes vinha da parada seguinte á dela e três dos passageiros notaram que ele tinha um volume saliente em um dos lados dos bolsos. Assim que foi liberado, esperou dez minutos para observar a movimentação das pessoas a bordo e então sacou seu pequeno revólver. Não havia alguém com habilidades especiais e nem uma Super Pessoa para contê-lo. A história poderia ficar bastante interessante com este ingrediente, mas infelizmente esta ficção tenta ficar mais perto da realidade e na nossa realidade tais pessoas não costumam existir fora das definições de um ser humano comum.
O pânico afligiu os usuários por alguns minutos enquanto o bandido andava entre as cadeiras para ver objetos de valor. Por sorte, Daniela escapou do assalto devido a pressa dele. Alguém fora do ônibus percebeu a ação, além do acompanhamento de um motociclista suspeito, e chamou a polícia. Um grande alívio se instalou no automóvel com a saída dele, mas a garota, Daniela, ficou ainda pensando por 5 minutos o que aconteceria se ele não tivesse saído. Ela viu o olhar que o homem possuía. Era um calmo que se tornou ferino em sua irritação. Uma mulher com a farda de um supermercado comentou que faria um Boletim de Ocorrência em voz alta e saiu cinco quadras depois, acompanhada de quatro amigas que também foram roubadas pelo assaltante.
Daniela gostaria muitíssimo de sair o mais cedo até seu destino, mas um congestionamento em uma avenida da rota do ônibus atrapalhou seus planos. Calculou que eram 15 minutos a cada metro rodado, mais ou menos, até chegarem a um ponto onde muitos se acumularam no lado esquerdo para verem a cena de um acidente. Alguns poucos tiraram seus celulares para fotografar o incidente. Um par de crianças se mantinha desatenta a esse detalhe, seus olhos se focando em seus cadernos. Seus lápis, notou Daniela que mantinha um olhar preocupado na dupla, estavam em mãos e eles pareciam estar pensando em alguma redação. Um idoso atrás dos dois resmungava sobre a incapacidade de se ter um trânsito mais rápido e fez reclamações do governo, citando problemas em sua própria rua que parecia uma esquecida das propagandas da televisão.
Oi, senhorita.
Hum?
Você está sozinha? Daniela se virou para sua direita e fitou um rosto de um estranho.
Sua mãe a recomendara não conversar com um desconhecido, então ela se manteve quieta. Ela também se manteve atenta a aquele par de olhos castanhos que pareciam a querer engolir viva. O homem era consideravelmente bonito e até tinha terno, gravata e sapatos de couro. Mas algo em sua postura e em seu interesse rápido a enviaram alarmes vermelhos de precaução. Ela não sabia explicar. Tensa podia estar, mas a sanidade não se desequilibrara a ponto de não conseguir distinguir um desejo genuíno de ajuda.
Peço perdão por assustá-la ele alargou seu sorriso, um que ela identificou como sendo de um predador Mas é que aconteceu tudo de repente, sabe? E o menino veio depois de você e fiquei com medo de você poder ir sozinha por aí.
“Não sorria”, pensou ela, tentando se concentrar em um shopping por onde o ônibus passava, “Não olhe. Faltam seis paradas. Depois das seis, é a minha deixa”.
  Você é uma menina tímida? o homem teve quase certeza que era: afinal, ele trabalhava, tinha boa aparência e bons olhos para pessoas que considerava legais. Achava-se um homem bom, um bom homem, uma boa pessoa. Aquela negação poderia ser apenas timidez, imaginou, ainda que se esforçasse para não perguntar se ela era muda.
Melhor você a deixar em paz o idoso atrás dos meninos enviou um olhar sério para o homem. E ele, pai de quatro jovens que andaram muito de ônibus em suas vidas de solteiras, pensou aborrecido “Conheço bem o que está acontecendo. Esses olhos grandes, essa boca grande e esses dentes aparecendo não me enganam. Ela não iria responder tão fácil, se ela percebeu” Olha aqui, rapazinho. Se ela não quer papo, isso significa fim de papo.
Ela não disse isso falou o que se achava um bom homem, interrogando-se mentalmente se aquelas pessoas não sabiam de quem ele era filho e que sim, estava sendo um bom homem, e mais do que isso, um homem respeitável Além disso, essa blusa vermelha cai bem em você...
“Essa conversa tá indo pra um rumo muito esquisito”, foi a primeira coisa que Daniela pensou antes de se ver forçada a romper a conversa:
Por gentileza, será que você poderia parar de conversar comigo?
Por que não? Isso seria uma grosseria, eu quero muito ajudar você.
Você é um estranho.
Eu me chamo Enzo Cavalcante ele retornou a sorrir para ela Agora, não sou mais um estranho. Qual é o seu nome?
Bom, Enzo Cavalcante um rapaz ali próximo disse da forma mais tranquila possível também não é muito educado forçar a barra.
Gabriel o homem leu a parte de trás da camisa esportiva que o menino usava também não é muito educado interromper. Você também é um estranho para essa menina.
No espaço em que a sua voz e dos passageiros não ocupavam, ouviam-se buzinas por cinco segundos. Na parte da frente do ônibus, pessoas idosas e uma gestante percebiam junto com o motorista uma demora, ainda que menor que a anterior, nos veículos. Várias pessoas nas passarelas atravessavam ruas. Havia venda de camelôs lá embaixo, como também a vigia de policiais em quem fosse suspeito de estar cometendo um crime. O semáforo indicava a cor vermelha.
Sim, ele é um estranho indignada com a declaração, Daniela se pôs a defender o garoto mas eu pedi pra você desconversar. Então, por favor?
Naquele momento, gotas de água começaram a aparecer nas vidraças da janela. Quem não estivesse prestando atenção na conversa e atentasse seus olhos para o céu daquele bom dia de outubro, poderia ver as nuvens cinzentas ficando cada vez mais carregadas e um raio dançando em zigue-zague rompeu no chão. Uma dos dois garotos viu o ocorrido e apontou com o cuidado de não ultrapassar seu braço da janela. “Olha, raio”, anunciou para ninguém em particular.
  Está bem, está bem mais pessoas davam atenção à cena, algo que Enzo considerou desagradável e Gabriel, o irmão das duas crianças, satisfatório Peço desculpas “completamente não”, ele acrescentou contrariado em sua mente.
Desconhecido tanto à Enzo como à Daniela, Gabriel não era exatamente um desconhecido. Estudara no mesmo colégio dela e já a vira várias vezes, razão pela qual se apressou em defende-la. Ele percebeu que ela não o reconhecera, mas ela havia o ajudado três vezes quando algum material escolar caia de sua bolsa, na época com problemas no zíper. Ele não se considerava um bom rapaz, mas, aos olhos do idoso e de alguns que observaram a discussão, era alguém mais respeitável que Enzo. Outras se encantaram com o look atraente de Enzo e uma chegou a responder suas perguntas, apesar de um olho dele plantar entre Gabriel e Daniela. Notando que o garoto espiava silenciosamente, mas sem ter respostas e não demonstrando reação negativa, deixou-o safisfeito e insatisfeito ao mesmo tempo.
Dois garotos e uma garota, todos universitários, aproveitaram o momento para colocar a situação como exemplo do porquê as pessoas precisam do feminismo e um casal distorceu suas expressões em desgosto por ouvirem a palavra, um deles fazendo críticas ao movimento dentro de seus debates mentais. Já uma mulher interpretou o bate-papo com uma má interpretação por parte de Daniela, Gabriel e o idoso, achando que Enzo tinha a atitude de um cavaleiro que era acostumada a ver em seu tempo. Um outro homem tinha uma visão similar, embora considerasse mulheres como classe inferior, e acrescentou em seu pensamento “Essa menina parece uma ratinha”. Outros continuaram suas vidas sem ter o acontecimento em mente, imersos em suas próprias preocupações muitas vezes silenciosas.
“Droga, por quê eu esqueci de não ter trazido meu guarda-chuva?”, essa passou a ser a preocupação de Daniela. Passado o sufoco com o assalto e Enzo (ela sentiu que ele parou de dá-la atenção), observou que o começo de noite raiava e chuviscava. O vento ruía baixinho e esfriava parcialmente dentro do veículo. Algumas pessoas preparavam seus guarda-chuvas. Faltavam duas paradas para Daniela descer. Ela não se viu sem escolha, olhando como seu único escudo sua própria bolsa. Não era um tempo a se contar com cavalheirismo, já que muitas vezes o verdadeiro cavaleiro surge com uma armadura inesperada.
O ônibus não se encontrava tão lotado como antes. Agachou-se e sentiu algo seco em sua mão. Espiou e viu que se esquecera de limpar uma mancha de tinta verde. Encaminhara-se, raspando os vestígios da substância com suas unhas, para o outro lado, onde havia a porta de saída. Um senhor tossia bastante na sua direita, acompanhado de seu parceiro mal-humorado. Ela esperou uma parada, pegou a bolsa para tentar proteger a cabeça e saiu na parada seguinte, vendo-se na rua da pizzaria.

Mas, por outro lado, a chuva não era muito misericordiosa.
CONTINUA...
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